ARQUITETURA INTERATIVA
Se por um lado o arquiteto e designer paulista Guto Requena usa a tecnologia de ponta como instrumento de trabalho, por outro revela o gosto por objetos de confecção artesanal.
Quando adolescente, Guto Requena ia com frequência para a sala da diretora da escola onde estudava, em Sorocaba, interior paulista. Era um aluno aplicado, mas tinha o hábito de desenhar casas nas carteiras escolares. Ninguém compreendia quando ele explicava que fazia a travessura no automático. A trégua durava uma semana até Guto voltar a rabiscar novas casas – e, de certo modo, seu futuro profissional. Sem arquitetos na família, o menino sempre quis exercer o ofício. Na infância, construía as cabanas mais elaboradas da turma e criou o hábito de sobrepor papel vegetal nas fotos da revista Arquitetura e Construção para “reformar” os apartamentos a seu modo.
As ideias saíram do papel assim que se formou em arquitetura e urbanismo na USP, em 2003. Planejou interiores de casas, criou espaços corporativos e abriu seu estúdio quatro anos depois. Em São Paulo, assinou o escritório da Google no Brasil e a sede da WallMart.com, projeto com o qual conquistou o Building of the Year 2014, importante prêmio da área, na categoria arquitetura de interiores. Ganhou notoriedade internacional quando expôs, na Semana de Design de Milão, a cadeira Nóize. Produzida digitalmente, a peça é resultado da junção do áudio captado na região da Santa Efigênia com a cadeira Girafa, um ícone do design brasileiro criado por Lina Bo Bardi – o arquivo dessa “mixagem” é impresso em 3-D.
Outro experimento digital do estúdio de Guto Requena com grande repercussão foi o Love Project – em que convidados narraram histórias de amor, um computador capturou dados ligados a suas emoções e, por meio de interfaces digitais, esses sentimentos foram traduzidos em obras impressas em 3-D. Um exemplo: Lais contou a história da descoberta de uma carta de amor que seu avô deixou para a avó, depois que eles já tinham morrido. A narração deu origem a um vaso que se tornou a obra oficial do projeto. “No Love Project, o produto está além da estética porque é gerado pela história que está sendo contada, então tem a questão da sustentabilidade afetiva. Esse objeto vai ter um ciclo de vida mais longo porque vai passar de geração em geração”, diz Guto.
Projetos que fazem uso das novas tecnologias são os que mais o instigam. Fascinado pelo tema que chamou de Cidade Hackeada, Guto pesquisa sistemas que possam ser plugados na cidade e funcionem em tempo real. “Que tal deixar os prédios de São Paulo mais interessantes, com fachadas verdes, terraços, sistemas interativos?”
A exemplo do que fala, no fim do ano passado revestiu a fachada do hotel WZ Jardins, na avenida Rebouças, com lâmpadas de LED que, com a ajuda de sensores, transforma o barulho e a poluição em cores. O arquiteto quer que as pessoas olhem para a cidade, interajam. Da janela do seu apartamento, próximo à Paulista e à Consolação, enxerga um pedaço de São Paulo que deseja melhorar enquanto fala dos objetos que traduzem sua história.
MESA TRENA
O VASO DE CAPIM DOURADO
“Trouxe este vaso do Jalapão (TO) para mostrar para a Galeria Bensimon, de Paris, que me chamou para desenhar uma coleção de objetos usando o capim dourado. Passei sete dias pesquisando no povoado de Mumbuca, onde foi descoberto o capim dourado, cem anos atrás. Fiquei fascinado com a história. Ele só existe no Brasil e a colheita acontece uma vez por ano. Gravei o ritual das artesãs cantando enquanto costuram para usar na produção das peças. Estou misturando a produção artesanal com a digital.”
O ESPELHO DO FASANO
BUBBLE CHAIR
A CADEIRA DE ARGILA
“Sempre me inspirei no trabalho do designer holandês Maarten Baas. Esta cadeira, a Clay Chair, faz parte de uma coleção que fala sobre o retorno do artesanal frente às tecnologias. Produzida à mão, é feita pela equipe que trabalha no ateliê dele, dá para ver as impressões digitais. A cadeira estava à venda na Rossana Orlandi, em Milão, uma das galerias mais importantes do mundo. Fui convidado para expor lá dois anos atrás e aconteceu uma guinada na minha carreira, saiu matéria em mais de 100 revistas.”